segunda-feira, 27 de setembro de 2010

DEVANEIOS

Mateus nunca foi de questionar as ordens dos pais. Eles planejaram para ele um futuro perfeitinho: escolas particulares desde a infância, passou em uma faculdade federal renomada, e no próximo ano estaria formado, pronto para encarar o mundo. Tudo isso o preparou muito bem para ganhar dinheiro, e isso é o importante, não é? Afinal, “quando o dinheiro fala, tudo cala”.

Ele estagia na maior empresa de bebidas do país e tem emprego garantido assim que se formar. O rapaz prefere não pensar que trabalha numa empresa responsável por produzir as drogas que matam milhares de pessoas no trânsito e acabam com famílias pelo vício. “De pensar, morreu um burro” – dizia seu avô e, nesse caso, Mateus preferia concordar.

Agora, a um ano de se formar, percebe que lhe disseram tudo o que deveria fazer a vida inteira, até aquele ponto. Ele deveria estudar, se formar e arranjar um emprego. Mas e depois? Ninguém disse nada sobre isso. A que ele vai se dedicar? O que ele realmente gosta? Vai se tornar um presidente de uma multinacional? Qual a emoção nisso?

“De pequenino é que se torce o pepino”, os pais dele diziam. Ele gostava de tocar guitarra, mas seus pais nunca o incentivaram, porque isso não proveria sustento. Ele gostava de pintar também. E de escrever. Mas nada disso passou pelo crivo rígido dos pais, e foi jogado às traças. Agora, Mateus não tem amor por seu emprego, não tem amor por dinheiro, não tem amor por viver a vida que foi planejada por outras pessoas.

Mateus tem medo do que está por vir, da vida que vai continuar vivendo. Daqui um ano ele vai estar livre de suas obrigações com seus pais e pensa seriamente em se formar e viajar para a Austrália, acampar, viver um pouco, escrever e aprender a tocar guitarra. Hoje, ele já sabe como se sustentar muito bem; então, se sente mais preparado para encarar essa aventura. Mais difícil será encarar seus pais.

Mas se não fossem eles, ele não se sentiria tão pronto assim. Se não tivesse passado por tudo o que passou, não teria esse forte ímpeto de viver a vida de verdade como ele bem deseja. Dizem que “para bom mestre não há ferramenta”. Será que isso tudo não foi planejado pelos seus pais? Toda a rigidez seria para ele aprender a dar valor ao que é dele? Bem, “a esperança é a última que morre”!

Gustavo Souto de Sá e Souza - EEEC/UFG

Um comentário: